A disciplina de Interação Humano-Computador, abreviada por IHC, e em inglês chamada de Human Computer Interaction (HCI), tem como objetivo estudar o projeto, implementação e avaliação de sistemas computacionais interativos (SCIs) para uso humano, ou seja, sistemas compostos por hardware, software e que apresentam comunicação com pessoas. Um sistema computacional interativo faz parte das chamadas Tecnologias da Informação e Comunicação (TICs), que se apresentam na forma de computadores e notebooks, dispositivos moveis como celulares e tablets, e outros dispositivos, como sensores e dispositivos inteligente, o que chamamos de Internet das coisas, em inglês, Internet of Things (IoT), onde temos como exemplo, sistemas de monitoramento e irrigação de solo para agricultura.
Com isso torna-se importante ter responsabilidade ao desenvolver tecnologias da informação e comunicação, pois essas tecnologias afetam pessoas, de forma direta ou indiretamente. É preciso ser capaz de prever impactos e ser capaz de projetar boas soluções, reduzir a ocorrência de eventos negativos, e fornecer opção para retificar erros. Deste modo, o estudo de IHC é feito de maneira multidisciplinar, utilizando-se não somente de conceitos da computação, mas também da psicologia, antropologia, semiótica, linguística, design e muitas outras áreas. A matéria tem como objetivo conseguir atender os chamados stakeholders, que seriam todos os interessados pelo sistema interativo, isso inclui, a pessoa responsável pela aquisição do sistema, a pessoa que irá usar o sistema, o qual se dá o nome de usuário, e aquele que constrói o sistema, que seria os analistas, designers e programadores.
Mas qual seriam os benefícios da disciplina de interação humano-computador? Pois bem, através da aplicação dos métodos de IHC podemos aumentar a produtividade dos usuários, pois ao tornar a interação dos usuários com o computador eficiente, estamos ajudando os mesmos a alcançar seus objetivos mais rapidamente. Podemos também reduzir o número de erros cometidos pelo usuário, sendo capaz de prever ações, e assim melhorar as respostas do sistema, fornecendo melhores oportunidades de interação com o mesmo. Pode-se também reduzir o custo de treinamento, ao tornar o sistema mais intuitivo, permitindo que as pessoas se sintam seguras para usar o sistema, possa cometer erros, corrigi-los, e aprender com os mesmos, o que ocasiona em redução no custo com suporte técnico. E por fim, será possível aumentar vendas e fidelizar clientes, que se sentiram mais satisfeitos ao utilizar o sistema para realizar suas atividades, e alcançar seus objetivos.
Assim podemos observar que IHC se distingue da tradicional disciplina de Engenharia de Software, abreviado por ES, pois a matéria de IHC está interessada na qualidade do uso dos sistemas interativos, e o impacto que o mesmo causa sobre seus usuários. Enquanto que ES estaria interessada em critérios de construção, com o estudo de técnicas para a construção de sistemas que sejam mais eficientes, robustos, livre de erros, e que tenham fácil manutenção. Assim pode-se perceber que é possível construir um sistema que seja agradável ao usuário, atendendo a disciplina de IHC, mas que tenha manutenção difícil, não atendendo ES, e o oposto também pode ocorrer, onde tem-se um sistema sólido e livre de erros, mas difícil de ser operador pelo usuário, ou que não seja útil para o mesmo. Por isso é importante o papel das duas disciplinas em conjunto para o desenvolvimento completo de um sistema interativo computacional.
Introduzimos então os conceitos básicos da disciplina de interação humano computador. Tendo como foco o “usuário”, no qual o mesmo participa de um processo de “interação” com o sistema, através da chamada “interface” de usuário. E essa interação acontece dentro de um “contexto” de uso, que inclui tempo, ambiente físico, social e cultural. O processo interação se dá com o usuário, que tem um “objetivo” em mente, e para alcançar o seu objetivo, ele executa uma série de “atividades”, que são mediadas pela interface, que é a parte na qual ele tem contato físico, seja através da manipulação de um “dispositivo de entrada”, como teclado e mouse, ou de um “dispositivo de saída”, como a visualização de uma tela, ou a escuta de sons provenientes de um alto-falante.
Outro conceito muito importante é o de “affordance”, onde as propriedades de um objeto indicam as possibilidades de uso, isso é, o conjunto de ações que podem ser executadas sobre o mesmo. Um exemplo prático, é o formato da maçaneta de uma porta, onde maçanetas redondas passam o “affordance” que devemos gira-las com as mãos, enquanto que uma maçaneta retangulares, passa a ideia de que devemos empurra-las para baixo. Assim há uma quebra de expectativa, quando temos uma porta onde o seu uso contradiz o seu affordance, como é o caso de portas com barras verticais, que passam o affordance que devemos puxa-las, mas na verdade são portas nos quais devemos empurra-las. Já em sistemas interativos, podemos notar affordance na diferença entre caixas de seleção retangulares (em inglês, checkbox button) e circulares (em inglês, radio button), onde as primeiras permitem selecionar mais de um item, e a segunda apenas um único item.
E dentre os critérios de qualidade em IHC, temos primeiramente o critério de “usabilidade”, que está relacionado o quão fácil é o aprendizado e o uso da interface, o que inclui também a satisfação em decorrência do uso. Esse critério tende a ser diretamente afetado pelas características do usuário, como o seu nível de cognição, sua capacidade para agir sobre a interface, e sua capacidade para notar os retornos do sistema. E com a proliferação de sistemas computacionais interativos para além do ambiente de trabalho, o estudo das emoções e sentimentos do usuário também passou a ser de interesse da disciplina de IHC, e a esse estudo dá-se o nome de experiência do usuário, em inglês, User Experience (UX). E assim podemos observar como que a disciplina de UX design é, na verdade, umas das áreas de estudo de IHC, e não o contrário, sendo o estudo de UX design uma parte, do estudo de sistemas computacionais, no qual a disciplina de IHC é responsável.
O próximo critério seria o de “acessibilidade”, que está relacionado a identificar e remover barreiras que impeçam os usuários de interagir com o sistema. Ajudando e fornecendo apoio para que pessoas que tenham algum tipo de deficiência, possam ser capazes de utilizar-se dos sistemas interativos para atingir seus objetivos, mesmo que utilizando-se de adaptações, como um leitor de tela para pessoas cegas, ou opções para aumentar tamanho de fonte e alto contraste, para pessoas com baixa visão. Por isso é crucial saber para que público o sistema interativo está sendo construído, para que as devidas modificações possam ser feitas para tornar o sistema acessível ao grupo definido. E por fim temos também o critério de “comunicabilidade”, que se trata da responsabilidade do design em comunicar aos usuários suas intenções de design e a lógica de funcionamento da interface, o chamado preposto do design, utilizando-se de padrões e conversões de design de interface existentes, e criando novas metáforas e conceitos quando for necessário.
Para atingir esses critérios de qualidade, existem normas, como a ISO/IEC 9126 (1991) e a ISSO 9241-11 (1998) que definem o que é usabilidade, nelas é utilizado a ideia de esforço necessário para uso de um sistema interativo, de maneira eficaz, eficiente, e que gere satisfação, dentro de um contexto de uso. A eficácia está relacionada com a ideia de completar uma atividade corretamente, e eficiência em ter os recursos necessários para completar a atividade. Com isso, Nielsen (1993) define um conjunto de fatores para medir o grau de usabilidade de um sistema, que seriam: a facilidade de aprendizado (learnability), a facilidade de recordação (memorability), eficiência (efficiency), segurança no uso (safety) e satisfação do usuário (satisfacition). A primeira, facilidade de aprendizado, é medida através dos conhecimentos e habilidade necessárias para usufruir das funcionalidades do sistema, na forma de níveis, básico, intermediário e avançado, ela se refere ao esforço necessário para aprender a usar o sistema, a um determinado nível de competência e desempenho.
O segundo fator de usabilidade de Nielsen, facilidade de recordação, diz respeito ao esforço cognitivo necessário por parte do usuário para lembrar como interagir com a interface do sistema, que foi aprendido no primeiro critério. Se a interface do sistema é mal organizada, e sem sentido para o usuário, o mesmo irá ter dificuldade para utiliza-lo. Para isso o sistema precisa guiar o usuário, e oferecer pistas para que os mesmos possam opera-lo, através de um conjunto de ícones, nomes, e opções bem projetadas. Já o critério de eficiência está relacionado ao tempo necessário para realizar uma atividade no sistema, e é determinado pela maneira com que o usuário o utiliza, o que inclui a inclusão de mecanismos para usuários avançados, como teclas de atalho. A segurança de uso está relacionada o como o sistema trata condições desfavoráveis e perigosas ao usuário, permitindo “evitar” que problemas ocorram, através de caixas de diálogo com mensagens de alerta, perguntando se o usuário tem certeza sobre a execução de uma ação destrutiva, ou através do mecanismo de recuperação, onde é possível voltar o sistema a um estado anterior que seja válido.
Por fim, o último fator de usabilidade de Nielsen seria a satisfação do usuário, que como vimos anteriormente, tem a ver com a experiência do usuário ao usar o sistema. Esse fator tende a ser o que menos recebe atenção, pois inicialmente os sistemas interativos eram vistos apenas como ferramentas para de trabalho. A investigação da satisfação pode ir além do que uma experiência positiva ou negativa, mas pode evocar outras subjetividades, como questões de estética e prazer da interface e o seu uso, bem como a questão de diversão e entretenimento, esses dois últimos que são muito relevantes para o caso de jogos. Podemos também ter experiências de provocação, surpresa, desafio, ou cansaço, frustração e ofensa. Com isso, podemos notar que é complicado conseguir um sistema como nota alta em todos os critérios, e nem devemos. A ideia é que os fatores sejam utilizados como guia para avaliar o que se deseja maximizar, e avaliar com cuidado o que será perdido com a maximização dos fatores de interesse.
No próximo artigo sobre esse assunto, será visto um pouco das abordagens teóricas da disciplina de IHC, como a lei de Hick-Hyman e Fitts, princípios Gestalt e engenharia cognitiva, e a fundamentação dos métodos e modelos para o projeto e avaliação da interação em IHC.